O Código Penal Brasileiro utilizou a expressão “Crimes contra a paz pública” ao se referir aos
crimes previstos nos artigos 286 e 289 e conforme o Professor Rogério Greco, em sua obra Curso de
Direito Penal – Parte Especial, Volume IV, página 219, paz pública “significa a necessária sensação de
tranquilidade, de segurança, de paz, de confiança que a nossa sociedade deve ter em relação à
continuidade normal da ordem jurídico-social”. Em outras palavras a paz pública é a tranquilidade que
deve emanar do sistema jurídico normativo. Isso quer dizer, portanto, que incumbe ao Estado, por ser
portador do poder-dever de legislar e de punir (jus puniendi), tipificar e, por conseguinte, punir
condutas que, de alguma forma possam, ofender a paz pública.
O douto ministro Celso de Mello, na sessão plenária de 22 de outubro de 2012, na qual se
julgava o escândalo do Mensalão, afirmou que “o conceito de paz pública remete à ideia de
‘tranquillitas ordinis’, vale dizer, à noção de sentimento geral de tranquilidade e de segurança das
pessoas, sentimento esse que lhes permite um convívio social harmonioso, pois o crime de quadrilha
constitui, pela só existência de sua formação, um estado de ‘agressão permanente contra a sociedade
civil’” ¹. Tais palavras nos dão o entendimento de que subsistem dois objetivos do direito ao prever
legalmente crimes que atentem contra a paz pública: Objetivamente se protege um convívio social
harmonioso, a ordem pública; subjetivamente, se protege o sentimento de tranquilidade dos indivíduos
em geral.
Os crimes contra a paz pública, portanto, ofendem a harmonia e estabilidade social, causando
nos indivíduos sentimento de insegurança pelo pensamento de que o mal que atingiu certa pessoa pode
atingi-los também.
ROL DOS CRIMES CONTRA A PAZ PÚBLICA
DA INCITAÇÃO AO CRIME - Art. 286. Incitar, publicamente, a prática de crime: Pena -
detenção, de três a seis meses, ou multa.
A conduta típica incitar significa provocar ou estimular a prática da realização de surgimento
de atividade delituosa, previsto no Código Penal ou em Lei especial. Sendo assim, não caracteriza o
delito se a incitação referir-se à contravenção. Exige-se que a conduta estimule grande número de
pessoas a cometer determinada espécie de delito, pois a expressão publicamente transmite a ideia de
que a instigação seja realizada a um número indeterminado de pessoas, sendo assim a conduta de
estimular genericamente o ingresso de pessoas à delinquência não constitui crime, não basta, portanto,
que seja coletivo, o estímulo à delinquência deve ser público. O crime também deve ser determinado,
sendo a simples conclamação a práticas de crimes em geral é fato atípico.
Não constitui crime a simples opinião no sentido de ser legalizada certa conduta (porte de
entorpecente, aborto, etc). Por esse motivo, o Supremo Tribunal Federal autorizou a realização das
chamadas “marchas da maconha”, que consistem em manifestação objetivando a descriminalização do
uso desse entorpecente.
A incitação ao crime pode ser exercitada por diversos meios, como: panfletos, cartazes,
discursos, gritos em público, e-mails, sites na internet, entrevista em rádio, revista, jornal ou televisão
etc., comente o crime quem, por exemplo, em entrevista, aconselha as pessoas a não pagar por
serviços, devendo fazer ligações clandestinas de água, luz, TV a cabo etc.; ou ainda, líder sindical que,
em discurso, diz que os operários devem destruir as indústrias em que trabalham.
APOLOGIA DE CRIME OU CRIMINOSO – Art. 287. Fazer, publicamente, apologia de fato
criminoso ou de autor de crime: Pena - detenção, de três a seis meses, ou multa.
Fazer apologia significa elogiar de forma eloquente, aprovar, defender, enaltecer, exaltar um
crime já cometido ou o autor do delito por tê-lo cometido. Comete o crime, por exemplo, quem, em
entrevista, elogia um empresário por ter, comprovadamente, sonegado milhões em tributos, ou um
assassino porque matou determinada pessoa.
Segundo a doutrina é uma incitação indireta, por via transversa, mas que atinge o mesmo bem jurídico
(a paz pública) ao estimular terceiros à delinquência. (CAPEZ, Fernando. op. cit. p. 251.).
A apologia pressupõe o elogio inequívoco e perigoso. Assim não se configura quando alguém
apenas narra o fato ou se limita a tentar justificar as razoes do criminoso.
Aplicam-se as mesmas ressalvas da incitação quanto à quantidade de meios possíveis (gestos,
palavras, etc.); à necessária publicidade do ato; à atipicidade de apologia a fato contravencional ou
imoral.
Diferencia-se da incitação porque se refere a fato pretérito. Comete o crime, dessa forma,
quem enaltece fato criminoso já ocorrido, ou o próprio autor do delito em função do delito que já
cometeu.
Quanto à apologia a criminoso, ressalta a doutrina que exaltar seu passado honesto ou criticar
o enquadramento do fato delituoso, por exemplo, constituem-se em defesa do réu, que não deve ser
confundida com o crime do art. 287 do CP, sob pena de restringir o princípio da ampla defesa.
QUADRILHA OU BANDO - Art. 288. Associarem-se mais de três pessoas, em quadrilha ou bando,
para o fim de cometer crimes: Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos. Parágrafo único - A
pena aplica-se em dobro, se a quadrilha ou bando é armado
Entende-se quadrilha como uma associação estável e permanente que necessita haver mais de
pessoas envolvidas com o objetivo de prática uma série indeterminada de crimes. Sendo um crime
autônomo conforme o art. 288, quadrilha tem a consumação do crime, independente das infrações
penais praticadas por aqueles que integram o bando. Respondem pelo crime de quadrilha em concurso
material.
Os crimes praticados podem ser furto e roubo, entre outros, porém praticados pelo bando
estável e permanente.
CONSTITUIÇÃO DE MILÍCIA PRIVADA (Art. 288-A. DO CP): Art. 288-A. Constituir,
organizar, integrar, manter ou custear organização paramilitar, milícia particular, grupo ou
esquadrão com a finalidade de praticar qualquer dos crimes previstos neste Código: (Acrescentado
pela L-012.720-2012) Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos.
Configura-se como crime comum podendo ser praticado por qualquer pessoa. Trata-se de
concurso necessário (ou plurissubjetivo), exigindo para tal a constituição da pluralidade de agentes.
No geral, compreende-se por milícia privada uma organização paramilitar que é formada
ilegalmente, com a finalidade de defender pela força uma coletividade ou facção. Observa-se que a
milícia é constituída, geralmente, por ex-policiais que ilegalmente, ilicitamente, agrupam-se e
assumem controle sobre uma determinada comunidade, ofertando serviço de segurança ou outro tipo
de melhoramento. Não confundir com empresas de segurança que prestam esse serviço legalmente,
tais empresas apesar de terem serviços cobrados pecuniariamente, são devidamente registradas pela
Policia Federal, sendo responsável por fiscaliza-las.
CONCLUSÃO
Diante o exposto observa-se que os crimes contra a paz pública são previstos no nosso
Código Penal, por se tratarem de uma afronta a tranquilidade social e a um convívio social
harmonioso. Desta forma, a punição por estes se faz imprescindível na medida em que a
aplicação da sanção penal se faz necessária por suas próprias finalidades, as quais são muito
bem explanadas pelo renomado jurista Fernando Capez:
“Sanção penal de caráter aflitivo, imposta pelo Estado, em execução de uma
sentença, ao culpado pela prática de uma infração penal, consistente na
restrição ou privação de um bem jurídico, cuja finalidade é aplicar a
retribuição punitiva ao delinqüente, promover a sua readaptação social e
prevenir novas transgressões pela intimidação dirigida à coletividade.
(CAPEZ, 2003, p. 332)
Portanto, com o intuito de proteger a segurança e tranquilidade da coletividade que o
legislador determinou que se considerem crimes as condutas que foram avaliadas pelo
presente trabalho, a fim de que se previna maiores riscos e danos à sociedade.
REFERÊNCIAS
GRECO, Rogério. Curso de direito penal: parte especial. 8ª Ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2012. V.4
CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: parte geral. 6.ed. São Paulo: Saraiva, 2003.
DELMANTO, Celso. e outros. Código Penal Comentado. 8. Ed. São Paulo: Saraiva, 2010
Davyla Oliveira
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